Solenidade de Cristo Rei
Jornada Mundial da Juventude em São Miguel, 2022
Ribeira Grande, 20 de novembro de 2022
O evangelho apresenta-nos o expoente do reinado de Jesus Cristo:
sem trono imperial, a partir da cruz dos condenados. Ao contrário
daqueles que o condenam, da parte de Jesus Cristo, a cruz, na qual
está suspenso, mostra a vitória sobre a violência e a opressão, a
vitória do amor. Perante os primeiros, Jesus permanece em silêncio.
Em contrapartida, ao que lhe pede compaixão, responde-lhe com
aquilo que os outros queriam ver acontecer, mas sem a morte na
cruz: «Hoje estarás comigo no Paraíso». Para Jesus ninguém se
salva a si mesmo, pois quem faz de si mesmo um fim, o seu fim,
perde-se a si próprio, porém quem perder a vida por causa d’Ele
salvá-la-á.
A compaixão foi a marca de Jesus de Nazaré. Muitas foram as
pessoas que através d’Ele experimentaram a compaixão divina. Foi
o seu modo de ser compassivo que escandalizou alguns dos que se
consideravam justos. Jesus nunca ficou insensível aos que lhe
expressavam a necessidade de serem perdoados e amados. A
todos, de alguma maneira, antecipou essa definitiva promessa:
«Estarás comigo no Paraíso».
O malfeitor chamado «bom ladrão» acaba por ser um modelo para
o discípulo cristão: pela correção fraterna que faz ao seu
companheiro malfeitor, pela responsabilidade que assume dos seus
atos e pela confissão de fé que faz em Jesus reconhecendo a sua
inocência.
Hoje, Cristo ressuscitado continua a distribuir a compaixão. Quando
dele nos aproximamos, para lhe expressar a necessidade de sermos
perdoados e amados, recebemos a mesma promessa: «Estarás
comigo no Paraíso». Por isso «damos graças a Deus Pai, que nos fez
dignos de tomar parte na herança dos santos, na luz divina. Ele nos
libertou do poder das trevas e nos transferiu para o reino do seu
Filho muito amado, no qual temos a redenção, o perdão dos
pecados».
Esta experiência de nos sabermos perdoados e amados, esta
promessa de nos sabermos salvos pelo amor, há de nos levar a
comunicar aos outros tamanha alegria.
A grande mensagem de que é portadora a Igreja é Jesus, como Rei
e Senhor. Sim, Ele mesmo, o seu amor infinito por cada um de nós,
a sua salvação e a vida nova que nos deu.
A mensagem que o Papa Francisco dirige hoje aos jovens inspira-se
na perícope evangélica: «Maria levantou-se e partiu
apressadamente». Destaca o verbo levantar-se, que significa
também «ressuscitar», «despertar para a vida». As narrações da
ressurreição usam muitas vezes os verbos: acordar e levantar-se.
Depois da Anunciação, Maria teria podido concentrar-se em si
mesma, nas preocupações e temores derivados da sua nova
condição; mas não! Entrega-se totalmente a Deus! Pensa, antes, em
Isabel. Levanta-se e sai para a luz do sol, onde há vida e
movimento, porque tem a certeza de que os planos de Deus são o
melhor projeto possível para a sua vida.
A Mãe do Senhor é modelo dos jovens em movimento, jovens que
não ficam imóveis diante do espelho em contemplação da própria
imagem, nem «alheados» nas redes. Ela está completamente
projetada para o exterior. É a mulher pascal, num estado
permanente de êxodo, de saída de si mesma para o Outro, com
letra grande, que é Deus e para os outros, os irmãos e as irmãs,
sobretudo os necessitados, como estava então a prima Isabel.
Cada um de vós pode perguntar-se: Como reajo perante as
necessidades que vejo ao meu redor? Busco imediatamente uma
justificação para não me comprometer, ou interesso-me e torno-me
disponível? É certo que não podeis resolver todos os problemas do
mundo; mas talvez possais começar por aqueles de quem está mais
próximo de vós, pelas questões do vosso território.
Quais são as «pressas» que vos movem? O que é que vos faz sentir
de tal maneira a premência de vos moverdes que não conseguis
ficar parados? A pressa da jovem mulher de Nazaré é a pressa típica
daqueles que receberam dons extraordinários do Senhor e não
podem deixar de partilhar, de fazer transbordar a graça imensa que
experimentaram. É a pressa de quem sabe colocar as necessidades
do outro acima das próprias. Uma pressa boa impele-nos sempre
para alto e para o outro.
Mas há também uma pressa não boa, como, por exemplo, a pressa
que nos leva a viver superficialmente, tomar tudo levianamente sem
empenho nem atenção, sem nos envolvermos verdadeiramente no
que fazemos; a pressa de quando vivemos, estudamos,
trabalhamos, convivemos com os outros sem colocarmos nisso a
cabeça e menos ainda o coração. Pode acontecer nas relações
interpessoais: na família, quando nunca ouvimos verdadeiramente
os outros nem lhes dedicamos tempo; nas amizades, quando
esperamos que um amigo nos faça divertir e dê resposta às nossas
exigências, mas, se virmos que ele está em crise e precisa de nós,
imediatamente o evitamos e procuramos outro; e mesmo nas
relações afetivas, entre noivos, poucos têm a paciência de se
conhecerem e compreenderem a fundo. Ora, todas estas coisas
vividas com pressa dificilmente darão fruto.
Os jovens são sempre a esperança duma nova unidade para a
humanidade fragmentada e dividida. Mas somente se tiverem
memória, apenas se escutarem os dramas e os sonhos dos idosos.
«Não é por acaso que a guerra tenha voltado à Europa no momento
em que está a desaparecer a geração que a viveu no século
passado», afirmou o Papa Francisco na sua mensagem para o II Dia
Mundial dos Avós e dos Idosos, tal como também não é por acaso
que, à medida que vão desaparecendo as gerações que viveram o
tempo do fascismo em Portugal, há outras que querem voltar a um
sistema politico totalitário, porque desde que nasceram só
conheceram a democracia, e ainda outras que querem voltar ao
tempo da Igreja anterior ao Concílio Vaticano II, porque desde que
nasceram não conheceram outro tempo. Há, pois, necessidade da
aliança entre jovens e idosos, entre netos e avós, para não esquecer
as lições da história, para superar as polarizações e os extremismos
deste tempo.
Recebamos, construamos e ofereçamos ao Pai do Céu e aos nossos
concidadãos na terra uma alternativa: «um reino eterno e universal,
reino de verdade e de vida, reino de santidade e de graça, reino de
justiça, de amor e de paz». Esse é o futuro da nossa juventude e do
nosso caminho por esse mundo.
Isso é tão importante que quando Jesus nos ensinou a rezar faz o
pedido: «venha a nós o vosso reino», tal como rezamos antes da
comunhão. O alimento que nos sustem pelo caminho é a Eucaristia,
o mesmo Cristo Ressuscitado, que nos dá força para que O sigamos
com perseverança e alegria.
Que o Espírito Santo acenda nos vossos corações o desejo de vos
levantardes e a alegria de caminhardes todos juntos. O tempo de
nos levantarmos é agora. Levantemo-nos apressadamente! E, como
Maria, levemos Jesus dentro de nós, como Senhor da nossa vida, da
nossa alma e do nosso corpo para O comunicar a todos.
Hélder, Administrador Diocesano de Angra