Nos 500 anos da Santa Casa da Misericórdia da Horta e no encerramento do XV Congresso Insular das Misericórdias dos Açores e da Madeira

Horta, 16 de outubro de 2022

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia Legislativa da RA dos Açores
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia Legislativa da RA da Madeira
Exmo. Senhor Presidente do Governo Regional dos Açores
Esmo. Senhor Representante do Governo Regional da Madeira
Exmo. Senhora Presidente da Assembleia Municipal da Horta
Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal da Horta
Senhores Deputados e Diretores Regionais
Senhor Presidente da União Nacional das Misericórdias Portuguesas
Senhor Presidente da União Regional das Misericórdias dos Açores
Senhor Presidente do Secretariado Regional das Misericórdias da Madeira
Senhor Provedor da Santa Casa da Misericórdia da Horta e na sua pessoa
saúdo os senhores provedores e provedoras aqui presentes
Senhora Presidente do Instituto de Segurança Social dos Açores
Senhor Presidente da União Reg. das Instituições Particulares dos Açores
Senhor Presidente do Conselho Geral da Universidade dos Açores
Revmo. Senhor Representante do Bispo do Funchal
Revmo. Senhor Pároco das Angústias e seus paroquianos
Demais autoridades civis e militares
Caros congressistas e Irmãos das Santas Casas, sobretudo da Horta
Uma saudação na eterna misericórdia àqueles que servindo as Santas
Casas nos Açores, recentemente nos deixaram: Frederico Maciel,
provedor da SCM de Velas e José Humberto Chaves, provedor da SCM de
Vila do Porto, por quem rezamos nesta celebração.

Reúne-nos nesta manhã a celebração Páscoa do Senhor Jesus
Ressuscitado, que fazemos na Eucaristia em cada domingo, como Ele fez e
nos mandou fazer, com fé, como oração e compromisso, ao longo de uma
tradição, hoje felizmente assinalada, nos 500 anos da fundação da Santa
Casa da Misericórdia da Horta.
Podemo-nos colocar em vários primas a olhar para esta centenária
instituição como beneficiários, utentes, seus familiares, irmãos, dirigentes,
colaboradores, voluntários, técnicos ou profissionais, cidadãos anónimos,
no tempo presente, no passado onde chega a nossa memória, e
certamente no tempo que há-de vir. Decerto vamos ter perspetivas
diferentes. Todas de bem, ainda que com limitações, imperfeiçoes e
dificuldades. «Santa Casa» e «Misericórdia» são designações tão fortes,
criam expetativas altíssimas, nem sempre possíveis de alcançar
plenamente por quem nelas trabalha.
Esta instituição não é pública nem privada, no sentido que não é do
Estado nem de privados, embora não sobreviva sem eles. É particular,
social e comunitária, fruto dos irmãos que se associaram para fazer o bem,
sempre que seja necessário, em situações em que a resposta não aparece,
não é possível construir individualmente, tarda a aparecer ou a fragilidade
humana reclama.
Trabalhar com a dedicação de amadores e com a competência de
profissionais nem sempre é fácil, de tal modo que não se caia nem no
voluntarismo ingénuo nem na ditadura do mérito ou da técnica. O que
seria desta Misericórdia sem os seus trabalhadores mais humildes, que
reclamam por melhores condições laborais, sem os seus irmãos e
beneméritos, sem os membros dos órgãos sociais, verdadeiros motores da
instituição, animados pelo evangelho, pela caridade e pela justiça?
Na próxima semana assinalamos outros 500 anos, da subversão ou da
total destruição de Vila Franca do Campo, ocorrida de 21 para 22 de
outubro de 1522, mas também não faltam episódios de destruição de
vulcões e terramotos que alteraram profundamente a vida do Faial. Como
não recordar a destruição de 1672 da Praia do Norte, de 1926 da cidade
da Horta, de 1957 do Capelo ou de 1998 em toda a ilha do Faial?

Parafraseando o Padre António Vieira, o certo é que a misericórdia, a
justiça e verdade ficaram de pé no Faial, graças à Santa Casa da
Misericórdia da Horta que, sem Plano de Recuperação e Resiliência (PRR),
assistiu e resistiu comprometida a todas essas calamidades naturais, de
brutal impacto social e económico para quem não emigrou, para já não
falar das crises sociais e políticas, seja da monarquia, do pombalismo, do
liberalismo, da república nas suas três modalidades, da democracia e da
autonomia.
Quando levamos uma semana de más notícias de comportamentos
impróprios e reprováveis de membros da Igreja católica em Portugal, nos
últimos 70 anos, que usaram mal o poder e a confiança que lhes foi
depositada, renovamos a fé n’Aquele que nos conforta e nos consola,
através da Igreja como sacramento universal de salvação, e acolhemos
com frescura o aniversário, por 500 vezes assinalado, da Santa Casa da
Misericórdia da Horta, uma das instituições mais antigas dos Açores e do
Faial; mais antiga do que a própria diocese de Angra, que só daqui a 12
anos é que completará cincos séculos de existência, se Deus quiser.
Faz sentido termos aqui uma presença tão forte da Região Autónoma da
Madeira, pois quando a Santa Casa da Misericórdia da Horta nasceu nós
pertencíamos à diocese do Funchal, entre 1514 e 1534, precisamente
durante o período em que esta Misericórdia viu a luz do dia.
Para chegarmos aqui quantos irmãos, desde os fundadores desta
Misericórdia, por quem nos vergamos, a todos os que a serviram ao longo
dos séculos, não deram trabalho, abnegação, generosidade e sacrifício
escondidos, tal como o nosso Deus é também um Deus escondido e que
se dá a revelar no mistério da encarnação, da ressurreição, do pentecostes
e da eucaristia?
O ideal é sempre o mesmo de 1520 ou 1522; o compromisso apenas foi
sofrendo ligeiras alterações; a fidelidade aos seus princípios mantem-se
sempre criativa na resposta às obras de misericórdia. Tal como Cristo está
sempre connosco assim estão os pobres também. As irmãs mais próximas,
no tempo e no espírito, desta Santa Casa são as Irmandades do Espírito
Santo, capilarmente enraizadas em cada uma das freguesias do Faial. São
parceiras inspiradoras a não esquecer, de quem a Misericórdia é herdeira.

Posso testemunhar em primeira pessoa, o serviço a uma misericórdia
durante nove com funções executivas, quando a SCM de Angra
completava 500 anos, pela alegria que sentia sempre que alguém recorria
à Santa Casa e encontrava ali uma resposta às suas necessidades, dada a
capacidade destas instituições.
Contudo, não podemos dizer que a obra está concluída. Não, as pessoas
são sempre novas e diferentes, cada rosto que chega é único, sempre
inacabado, com uma história irrepetível e exigências maiores. A alegria e o
prazer de praticar a misericórdia e de dar o melhor de si mesmo
suplantam as dificuldades.
A mensagem desde domingo é de confiança em Deus, a partir de uma
pobre viúva que recorre a juiz iníquo, pela oração insistente e
perseverante, e certamente pela ação de misericórdia e justiça também
persistente, se não for pela nossa bondade, pelo menos que seja pela
insistência e perseverança de quem clama por justiça e misericórdia.
Perante o grito de Jesus ou de qualquer pessoa que diz «tenho sede» não
podemos ficar indiferentes, é um grito mais forte do que dizer «amo-te».
Foi a partir deste grito que Madre Teresa de Calcutá fundou a
congregação cujo objetivo é «extinguir a infinita sede de amor pelas almas
de Jesus na cruz, através da profissão dos conselhos evangélicos e da
adesão total e plena ao serviço dos mais pobres dos pobres (…). O coração
e a alma das missionárias da caridade é só este: a sede de Jesus escondida
no pobre».
Deus convida-nos a rezar com insistência, não para se fazer rogado, nem
por não saber as nossas necessidades, nem porque não nos ouve. Nas
dificuldades o Senhor está ao nosso lado, não lutamos sozinhos; a nossa
arma é a oração, que nos faz sentir a sua presença amorosa ao nosso lado,
a sua misericórdia, e também a sua ajuda.
A luta contra o mal é árdua e longa, exige paciência e resistência, como
Moisés que devia manter as mãos levantadas para fazer com que o seu
povo vencesse. Há uma luta a empreender todos os dias. Deus é o nosso
aliado. Não rezamos para o convencer, manipular ou satisfazer os nossos

caprichos, mas para nos convencermos da sua presença e do seu amor,
mesmo sem ver resultados imediatos.
A fé n’Ele é a nossa força e a oração é a expressão dessa fé. A oração
alimenta a fé, isto é a relação de confiança, e ao mesmo tempo exprime
essa fé. Se se apaga a fé, apaga-se a oração e se deixamos de rezar apaga-
se a fé, aumenta a escuridão, sob o perigo de nos perdermos pelo
caminho.
Portanto, aprendamos da viúva do evangelho a rezar sempre. Esta viúva,
símbolo da fragilidade e da indigência humana, sabia lutar pelos seus
filhos, tal como tantas mulheres e mães lutam hoje. Uma forma pacífica
de lutar é rezar uns pelos outros.
Rezemos sempre como expressão da nossa fé e da confiança num Deus
que nos chama a combater com Ele, todos os dias, para vencer o mal com
o bem e com a misericórdia que aí tem a sua fonte. Assim seja.

Hélder, Administrador Diocesano de Angra

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